Durante um passeio a pé ao fim da tarde, aproveitando as tréguas que o calor de domingo nos concedeu, deparámo-nos com a porta de uma casa (desabitada há cerca de um ano) partida. Evidente tentativa de arrombamento.
Os comentários podiam ter sido evitados, mas não foram. Saíram espontaneamente:
Eh pá, tentaram assaltar aquela casa! Olha para a porta! Pois... vazia há tanto tempo...(Frases normais, que se dizem ao telefone ou comentando uma notícia que se lê.)
-
O que foi, mãe? Quem foi, mãe? - aos 3 anos, já nenhuma* conversa passa ao lado.
Hesitei. Aquele medo de lhe criar medos...
- Foram ladrões.Reparei na expressão intrigada e até preocupada dela e apressei-me a continuar a explicação. Com naturalidade.
- Há ladrões, pessoas que roubam coisas. E isso não se faz, claro.-
E eles andam na guga [rua]
?- Às vezes podem passar... ou sabem que não mora ninguém ali e... Mas olha, não precisamos de nos preocupar, porque de certeza que a polícia já os prendeu e já se zangou com eles e explicou-lhes que isso não se pode fazer... Como o Sonso e o Mafarrico, sabes? Do Noddy?Ok. Mas senti que a conversa não tinha terminado.
Mais tarde, depois do banho.
- Os lad'ões ent'am nas casas?Voltei a explicar tudo. E assegurei que a polícia trata do problema. É isso que ela faz. E que há ladrões, sim senhora, poucos, mas há. E o mais importante de tudo: não entram na nossa casa.
Aprendi que, mesmo as histórias reais, não devem nem precisam de ser
corrigidas.
O assunto ficou encerrado e as peças ladrões/polícia/cadeia bem encaixadas naquela cabecinha. Foi ontem, podia ter sido hoje ou daqui a três meses.
*Cada vez tenho mais a certeza disso. Nenhuma, mesmo. Até quando não estão a olhar ou parecem entretidos com outras coisas.